O pedido de perdão que Lobão escreveu para Gil, Chico e
Caetano, visto como um recuo pela esquerda e como um cheque-mate pela direita,
nada mais revela do que o óbvio: o comportamento visceral de pessoas sem
capacidade de argumentação nas redes sociais também atinge os chamados
formadores de opinião.
Se a ortografia da língua portuguesa já nos faz a todos
cometermos nossos equívocos, a incapacidade argumentativa dos "milhões de
imbecis" de Umberto Eco provoca uma tragédia social nunca antes vista na
história do mundo - ainda que do mundo virtual. Idéias, propostas, argumentos,
nada vale. De útil, na visão dos milhões de "neocientistas políticos"
brasileiros, apenas a agressão.
Lobão é autor de obras primas. Na minha avaliação de fã,
como música, Me Chama. Como disco, A Vida É Doce. A música brasileira não seria
a mesma sem essas pérolas. Mas, como conjunto, não há comparações com a
produção de Chico, Gil e Caetano. Ainda
assim, o roqueiro assumiu um papel importante no vazio argumentativo da vida
moderna, em que mais vale um like numa postagem falsa - já que ninguém vai ler
além da manchete - do que uma discussão séria sobre qualquer assunto.
Autor de frases como "pau no cu de deus", em uma
antiga discussão estética com o maestro Júlio Medaglia no extinto Programa
Livre do SBT, Lobão dirigiu sua verve sarcástica e agressiva nos últimos anos a
questões políticas. E foi onde perdeu a mão.
Mas o fato é que, por experiência própria, o embate
constante cansa, oprime, deprime. É preciso, em um momento ou outro,
desarmar-se. Foi a conclusão a que chegou, tardiamente, Lobão. Apesar de nunca
ter sido respondido nos mesmos termos agressivos pelos três pilares da MPB
clássica, de ser uma voz com eco apenas nos setores mais radicais da sociedade,
de sua imagem mais folclórica do que a de alguém a ser levado a sério, o velho
lobo sentiu o peso da raiva, de sua própria raiva.
Ao contrário do que, em vão, tenta fazer agora, após a
publicação da carta, provocando Gil, Chico e Caetano a emitirem uma resposta,
Lobão nada mais quer do que o que realmente pediu: perdão pelas bobagens
escritas e faladas ao longo dos últimos anos, potencializadas pela histeria e
convulsão sociais recentes. Mais do que reassumir o papel de um dos porta-vozes
da direita, Lobão quer, apenas e desesperadamente, ser levado a sério. Resta
saber se ainda há tempo.