quinta-feira, 31 de julho de 2025

Uma leve tristeza no olhar

Pedro já foi menino medroso. Já foi passador de cola na fábrica de sapatos e desenhista de pequenos projetos arquitetônicos. Crente e ateu.

Hoje, Pedro não passa nem cheira cola. Não desenha. Não é mais uma coisa nem outra. Hoje, Pedro gasta suas horas pensando no dia seguinte.

Ele se lembra que já foi inquieto um tempo. Que enfrentou desafios. Mas, agora, tem medo de sair na rua à noite. No fundo, no fundo, Pedro teme a possibilidade.

Pedro chega sozinho ao bar. Ocupa a mesa de sempre e busca rostos conhecidos. Aos poucos, vão chegando todos.

A moça de lábios vermelhos e olhos dissimulados. Do beijo roubado em lugar arriscado.

O velho amigo, agora mais velho, não reconhece Pedro. Traz no rosto o peso dos sonhos não dormidos. Alguma coisa entre a melancolia e a tristeza.

A antiga namorada. Bela, como naquele dia. Parecia ainda esperar alguém.

Outro velho amigo se aproxima. Quer saber como vai a vida. Depende do que vai acontecer amanhã, responde Pedro, com a amargura de sempre. E o outro velho amigo sorri compreensivo. Era o otimismo e a satisfação dele com tudo que Pedro admirava e desprezava ao mesmo tempo.

Pedro nasceu num dia festivo, revela o calendário. E o nascimento trouxe muita comemoração, contavam a ele. Mas Pedro carrega uma leve tristeza no olhar.

Pedro já quis ser cantor de grupo infantil e ator de telenovela. Já desejou a mocinha bonita da televisão. Já quis ser pedreiro e se chamar Moacir. Mas Pedro apenas carrega uma leve tristeza no olhar.

Ninguém sabe, nem ele mesmo, explicar essa coisa estranha que não sente. Talvez tenha ficado assim depois de ver que o Baixinho, o pedreiro da casa da frente, tinha apenas pipoca murcha para comer com o arroz frio. Tem gente que diz que Pedro ficou assim depois da morte do cão companheiro que o seguia pelas ruas escuras. Mas o mais certo é que Pedro tenha ficado vazio ao ouvir que alguém o amava. Porque Pedro não ama ninguém.

Um a um, dos velhos amigos a antigas namoradas, foram se levantando e deixando o bar. Um aceno, um aperto de mão, um abraço, um beijo no rosto. Tudo isso deixaram para Pedro. E também o deixaram sozinho. Com ele ficaram a música suave, o vinho manchado de vermelho, o cigarro levemente amargo e o escuro do bar.

Talvez seja por isso que Pedro carrega uma leve tristeza no olhar.

(Goiânia, 2004).

Nenhum comentário: