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Frey e os sinais da mentira (F: Charles Guedes) |
Em
tempos de pandemia, o uso constante de máscaras esconde algumas
expressões, especialmente os diversos movimentos da boca, como os
sorrisos, e os seus inúmeros significados possíveis. Mesmo assim, é
possível perceber indícios de meias verdades ou mentiras completas
em muitos gestos e sinais, até mesmo em atividades à distância e
online, como o home office.
Segundo o pesquisador e especialista em psicologia da mentira,
Georg Frey, “mesmo com limitação da leitura dos micro
sinais faciais por conta do uso de máscaras ou por estar a
distância, é possível perceber indícios de que a pessoa está
tentando fazer com que algo não verdadeiro, uma mentira, seja
assimilado como sendo uma verdade. Para isto, é fundamental analisar
um conjunto de gestos e comportamentos”.
Entre as diversas possibilidades de comportamentos, gestos e ações
corporais a serem observados, Georg Frey destaca:
Pessoalmente ou em vídeo chamadas
Olhos - Observe se a pessoa está piscando
muito. Piscar rapidamente e com frequência maior que o normal é
forte indício de que a fisiologia dessa pessoa está alterada.
Piscamos mais quando mentimos porque não conseguimos controlar o
nosso sistema nervoso autônomo (SNA). Quando nos sentimos em perigo,
com risco de sermos pegos e sofrermos algum tipo de punição ou
vergonha, nossa adrenalina dispara, aumentando a freqüência
cardíaca, dilatando as nossas pupilas. O piscar mais faz parte desse
conjunto de reações, inclusive como tentativa natural do corpo em
manter os olhos abertos por mais tempo, caso uma fuga imediata seja
necessária.
Mãos – Perceba os gestos feitos com as
mãos. Como o corpo fala o tempo todo, os movimentos das mãos podem
revelar esforços adicionais para que uma afirmação seja aceita. Um
indicativo de esforço extra para que acreditem em nossas mentiras
são o esfregar de mãos, o estalar e/ou apertar de dedos, um reflexo
de uma força a mais que se faz para conter a ansiedade causada pelo
ato de mentir.
Voz - Atenção se a pessoa gagueja em algum
momento. Tropeçar em alguma sílaba ou ter dificuldade na pronúncia
contínua e natural de uma palavra ou frase frequentemente pode ser
associado a um comportamento ansioso. Ansiedade resultado de um
cérebro que está trabalhando, freneticamente, na elaboração de
histórias que convençam e garantam algum reconhecimento,
privilégio, impunidade ou qualquer outro tipo de vantagem.
Pés - A posição dos pés, se eles
apontam, mesmo que involuntariamente, para um desejo ou intenção de
fuga. De forma absolutamente natural, o corpo programa posturas de
fuga, como que para escapar de uma situação inconveniente por causa
de uma mentira descoberta.
“É bom lembrar que mentir é algo absolutamente comum a
qualquer tipo de pessoa. Independe do nível social, econômico,
identidade sexual, idade, geografia ou religião. A única diferença
já constatada é a de que homens mentem mais e as mulheres mentem
melhor”, afirma Georg Frey. A mentira, também, varia em seus
graus de perigo e intensidade. O psicopata é o detentor das mais
elaboradas, convincentes e destrutivas mentiras. “Estar na
teia de um psicopata, geralmente é sinônimo de ter a sua vida
destruída”, lembra Georg. O mentiroso patológico, muitas
vezes, precisa de intervenção e tratamento, como um dependente de
drogas.
Para aqueles que acreditam que a modernidade inventou a mentira, é
bom lembrar que historicamente a mentira está registrada como um
traço da nossa humanidade. Encontramos vetores da mentira nas
mitologias nórdica (Loki), grega (Hemera e Hermes), egípcia (Seth)
e indígena brasileira (Anhangá). Mentir sempre fez e fará parte da
condição humana. Não mentimos mais do que os nossos antepassados.
Se hoje temos essa impressão, é por conta das redes sociais que têm
a capacidade de multiplicar uma mentira, transformando-as em fake
news.
O especialista lembra que as pessoas mentem pelos mais variados
motivos, na maior parte das vezes esperando ter algum tipo de
vantagem, seja financeira, profissional, social ou sexual. Quem mente
dessa forma sabe dos riscos que corre, mas sempre acha que, de alguma
forma, pode valer a pena. Em uma relação afetiva ou familiar, com
as pessoas forçadas a uma maior convivência por causa da
quarentena, as mentiras podem surgir com mais frequência e ter suas
motivações expostas mais claramente.